O estudo também mapeou dados como faixa etária, tempo de magistratura e dificuldade dos magistrados idosos com as novas tecnologias
O uso de novas tecnologias, somado à pandemia de Covid-19, levou o trabalho jurisdicional para dentro da casa dos magistrados. As magistradas brasileiras afirmam perceber que o trabalho remoto gerou o aumento da violência doméstica e familiar dentro da classe durante o período de isolamento. Cerca de 68% afirmaram ter sentido um aumento desse tipo de violência.
É o que mostra a pesquisa “O exercício da jurisdição e a utilização de novas tecnologias de informação e comunicação”. O levantamento foi realizado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) por meio do seu Centro de Pesquisas Judiciais (CPJ).
A presidente da AMB, Renata Gil, afirmou que a pesquisa mostra que a violência doméstica é um fenômeno mundial e os resultados podem ajudar na criação de políticas públicas de enfrentamento. “A pesquisa é reveladora e será importante na criação de políticas públicas internas no âmbito do Conselho Nacional de Justiça”, disse a magistrada.
O diretor do CPJ, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, afirmou que o levantamento mostra que as juízas passam pelos mesmos problemas que as mulheres da sociedade em geral.
A pesquisa, que é dedicada ao estudo da transformação digital da prestação jurisdicional no Brasil, foi feita em parceria com o Laboratório de Acesso à Justiça e Desigualdades (LADES), vinculado à Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) e com o Colégio Latino-Americano de Estudos Mundiais, programa da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso/Brasil). O estudo também contou com financiamento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF).
Acúmulo de trabalho
Para as mulheres magistradas, a nova rotina também acarretou o acúmulo de trabalho: a jornada nos tribunais com a jornada doméstica e o cuidado com a família. Dados revelam que 80% das magistradas respondentes afirmaram que sentiram esse acúmulo de trabalho na jornada remota. Além disso, 52% das juízas também afirmaram que houve uma invisibilização institucional das necessidades específicas das mulheres.
As mulheres magistradas são 35% das respondentes – percentual próximo do número de mulheres que exercem a magistratura no Brasil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Entre os magistrados que responderam à pesquisa, 64% são homens – e 12% preferiram não responder.
Perfil dos magistrados
A pesquisa também é importante para traçar um perfil dos magistrados brasileiros, como o tempo que atuam na magistratura e a faixa etária. Os dados mostram que a maioria dos respondentes atua há mais de 10 anos como magistrados – 30,93% estão na carreira entre 20 e 29 anos e 31,04% atuam nos tribunais entre 10 e 19 anos.
Magistrados de todos estados responderam aos questionamentos da pesquisa, mostrando a realidade de todo o país. A grande maioria (1549 respondentes) trabalha nos Tribunais de Justiça estaduais. Também há respostas de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho (232), dos Tribunais Regionais Federais (24) e dos Tribunais Regionais Eleitorais (9).
A faixa etária dos respondentes também foi analisada e pode ser um indicador de uma maior experiência pessoal e profissional. De acordo com a pesquisa, mais de 35% dos magistrados respondentes têm entre 40 e 49 anos e 28%, entre 50 e 59 anos.
Necessidades das pessoas idosas
Os magistrados idosos, com idade igual ou superior a 60 anos representam 14,5% dos respondentes. Eles puderam opinar sobre as necessidades das pessoas idosas na adaptação ao uso de novas tecnologias. Para 57,2%, existe uma necessidade de aprendizado contínuo para conseguir utilizar as tecnologias implementadas no ambiente de trabalho. Mais de 25% ainda relataram a perda de autonomia e a necessidade de apoio para a execução de algumas tarefas que dependem da utilização de novas tecnologias estabelecidas no ambiente de trabalho.
Etnias da magistratura
Outro dado avaliado pela pesquisa foi a etnia dos membros da magistratura. Entre os respondentes, 77% se consideram brancos, 16% pardos, 2% pretos e 1% se identifica como amarelos. Cerca de 4% preferiram não responder. Para corrigir as distorções, o CNJ estabeleceu a adoção de políticas de cotas no âmbito do Poder Judiciário. A Resolução nº 203 prevê a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e de ingresso na magistratura para pessoas negras.
Laura Beal Bordin (Ascom AMB)